sábado, 12 de setembro de 2015

Sonhar IV: Preparação

"Dizem que os massai morrem quando são colocados na prisão, não imagino que essa situação um dia possa mudar", é a primeira frase do filme A massai branca (The white massai), filme baseado na história real de uma escritora suíça que largou tudo que tinha na Europa por uma paixão,um guerreiro massai, e foi morar com ele no deserto. O filme é maravilhoso, e conta justamente tudo que ela passou morando em um deserto no Quênia. Lembro que quando eu era adolescente, uma amiga me falou: "Marcela, achei um filme a tua cara, tu tem que assistir". Assiti. De fato, eu tinha que assitir. Eu fiquei muito encantada com as cores e as vestes do povo massai. Mais encantada ainda fiquei com a África e suas tradições milenares, seus povos ricos de culturas diversas e muito, muito curiosa a respeito do que aconteceu de fato com esse casal. Nascia alí uma paixão bem escondidinha por aquela história. Passei dias pesquisando sobre os massai, sobre a história real da escritora suíça e o que acontecera com os envolvidos na vida real. Fiquei fascinada. 

2015, São Paulo. Eu e uma amiga estávamos descendo pela escada rolante do hotel onde estávamos participando de um evento. Olho para o lugar que queríamos ir e vi um ponto de luz. Uma pessoa que brilhava estranhamente e não entendi porque. Nos aproximamos da menina que lia algo muito concentrada. Nos apresentamos, trocamos sorrisos, e ela nos fala gentilmente: Sou do Quênia, uma das finalistas da premiação. Era nossa mais nova amiga-inimiga. Passamos dois dias nos encontrando por lá, falando de trabalho, cidades, projetos.

No final desse evento, teve uma premiação. No entanto, antes, teve um ensaio. Quando entramos no auditório, de longe vi a moça do Quênia vestindo uma tecido lindo, vermelho e preto, que se fazia de túnica em volta do seu corpo pequeno mas ainda muito brilhante. Fomos falar com ela e elogiar a vestimenta, então ela com o mesmo sorriso acolhedor falou: é um tecido massai. Meus olhos se encheram de lágrimas. Eu sentei, pensei, lembrei. E muito emocionada pedi a ela que me deixasse vestir aquele tecido apenas para tirar uma foto e toca-lo com mais calma. Quando o vesti, o toquei, eu senti algo muito diferente do que tinha sentido a vida toda. Eu estava com tecido massai feito numa tribo no Quênia e parecia que eu estava esperando aquele dia chegar a muito tempo, sem saber, mas eu esperava. 

Horas depois, veio a premiação oficial. A moça do Quênia, em seu vestido massai, chorava agradecendo o prêmio, e eu chorava pela oportunidade de ver tudo aquilo acontecendo na minha frente, quase em câmera lenta. 
No fim, inesperadamente, eu e minha amiga recebemos a notícia que teríamos um prêmio também e que vamos para Nairobi, no Quênia. A minha reação foi de espanto. A surpresa nos fez vibrar por horas. Foi aí que eu entendi, que aquela paixãozinha que eu senti quando adolescente era apenas a preparação para um momento maravilhoso que acontecerá na minha vida. Estava tudo certo, tudo me esperando e todas as coisas que eu passei até hoje estavam sempre me preparando para fortes emoções. 

Guardei o olhar daquela moça e seu sorriso me vem a mente toda vez que olho os brincos que ela me deu da mesma cor do tecido que ela estava vestindo. A única exigência que ela fez foi que eu usasse os brincos quando for encontra-la no Quênia. E quero muito ir para finalmente dar vazão a uma paixão que sempre esteve guardadinha no fundo do meu coração. 

segunda-feira, 2 de março de 2015

Lar XIV

Sem dúvida, o meu aniversário inesquecível foi o de 9 anos. Não por causa de festa ou presentes, mas por causa de uma situação um tanto... dolorida. 
Quando eu era bem pequena(sim, já fui menor do que sou hoje), era costume toda noite ir brincar na rua - no Alto da Caixa D'água - com os meus amigos. Quando o assunto era médico, todos falavam a mesma coisa: "Só não toma bezetacil" (benzetacil, ne verdade). Fiquei com aquilo na cabeça. Um dia a minha mãe me levou a uma médica e depois de ela me examinar, ela me pôs no colo e disse: "Olha, bebê, você vai tomar uma benzetacil, vai doer um pouquinho só, viu?" Eu inocentemente acreditei, ignorando os conselhos dados pelos meus amiguinhos. Lá fui para a sala do abate. Quando a enfermeira aplicou a injeção, eu dei um grito tão alto que quando eu saí da sala, TODOS estavam olhando para a sala de onde o barulho viera e os olhares foram me acompanhando até eu sair. E eu aos prantos. 
Anos depois, eu estava com a garganta inflamadíssima. Era 26 de fevereiro de 2010. Aí a minha mãe me levou ao médico novamente. Chegando lá, mesmo procedimento e inclusive a mesma prescrição: benzetacil. Mas dessa vez eu não vacilei. No posto de Aratuba antigamente, o médico dava a receita e os pacientes iam buscar o remédio na farmácia que ficava atrás do prédio. No momento que a minha mãe deu as costas para caminhar para a farmácia, eu corri, mas corri, mas corri, corri para deixar o Asafa Powell no chinelo. Cheguei em casa, me traquei no quarto e fui pra deibaixo da cama. Algum tempo depois a minha mãe chegou furiosa porque eu tinha fugido. E lá do quanto eu dizia: "Nunca mais vou sair desse quarto". Depois de muito tempo debaixo da cama, eu fiquei pensando: "E a escola?", "E quando eu ficar grande?", "Eu nunca mais vou brincar na rua"... esssas perguntas fundamentais na existência da pessoa. Mas minha mãe me fez responder tudo. Na segunda-feira, 1º de março, teve grito, outras crianças e muitas mães, mas não era a minha festa de aniversário não, era eu de volta ao posto de saúde recebendo uma bela benzetacil de presente. 

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Sonhar III - Uuuuui



Depois de várias perguntas técnicas, o entrevistador me falou: "Agora, posso te fazer uma pergunta apenas por curiosidade? Aquele cara com você no seu perfil do gmail é o Neil deGrasse Tyson?" Sorri. Sim, é ele sim e tenho uma história sobre essa foto. 

Antes de voltar para o Brasil, eu tinha que escolher a última cidade para conhecer. Não tive dúvidas. Eu tinha que ir na Big Apple. Não por causa da Estátua da Liberdade ou por outra coisa senão visitar o Hayden Planetarium, lugar que o meu amado, idolatrado salve salve Neil deGrasse Tyson trabalha. Então arrumei as malas, esqueci meu DS em casa e fui para a lindíssima NYC com um grupo muito especial de amigas. Chegando lá, fomos visitar todos os lugares que queríamos ir juntas. Mas eu estava certa de ir no Haydem Planetarium embora isso não parecesse uma programação legal para as minhas amigas. Então decidimos criar o "Dia do Tudo Pode". Seria um dia que cada uma iria sozinha visitar algo que gostaria de conhecer, mas que as outras não queriam ir haha. No meu coração, sempre alimentei o sonho de conhecer o Dr. Tyson. Então, inocentemente eu pensei: "Sexta ele provavelmente não estará lá, muito menos no final de semana, segunda-feira é feriado nos EUA, então vou apostar na terça." Pois bem, terça-feira foi meu dia do tudo pode. Acordei, me arrumei, e parti para o American Museum of Natural History (que se você quiser, pode pagar 1 dólar para entrar). Comprei o ticket para entrar no planetario. Subi para o andar do elevador de entrada, tirei várias selfies para postar com uma legenda tipo "Uuuuui, ela tá no Hayden Planetarium". Ficaram horríveis. Fui para a fila da entrada do elevador, entreguei meu ticket para que uma parte dele fosse destacada, e fui para frente do elevador. O elevador ao lado fez aquele barulho avisando que iria parar. Olhei. Eis que surge um homem alto, negro, com uma voz muito familiar. Era ele. Eu estava de frente com o Dr. Neil deGrasse Tyson. Meu coração veio para a minha boca, meus olhos se encheram de lágrimas (pra variar). Eu tinha que falar com ele. Então eu virei para a mulher que coordenada a fila e perguntei: 
- Posso sair da fila e voltar depois? Preciso falar com o Dr. Tyson. 
Aí ela me olhou de cima a baixo e disse:  
- Não.
- Mas moça, é meu sonho falar com ele e ter uma foto com ele, por favor.
- Não, se você quiser, depois da apresentação, você vai procura-lo por aí. 
Me zanguei. Levantei a faixa que separava a fila, corri, corri , corri e quando eu finalmente o alcancei, esqueci as regras da educação americana, e fui logo tocando no braço dele, quase sem poder falar.  
- Doctor... doctor... Could you please take a picture with me? 
Ele olhou para mim e sorriu: 
- Calma, calma, respire fundo. Está tuuuuudo bem! 
Aí foi que eu chorei. Ele perguntou de onde eu era, em  que parte do Brasil eu morava. E eu no céu. Eu disse : Dr, eu te admiro demais, você me inspira muito. Eu vim para NYC apenas para conhecer esse planetário. Hoje eu realizei um sonho (Apesar de eu ter morrido de pena de Plutão ter saído da lista de planetas do Sistema Solar por causa dele). 
Ouvi um "Oh my Gosh, she's from Brazil" de uma moça que estava o acompanhando.
Ele carinhosamente falou: Então vamos tirar essa foto! A moça que estava com ele nos fotografou. 
E o resultado foi esse aí em cima. Sorriso e olhos cheios de lágrimas. 
Depois de tremer, chorar, e pessoas virem me perguntar "Quem é esse homem? Por que você está chorando?" eu fui para a fila da entrada do planetario de novo - Ok, eu tinha uma foto com o cara, mas tinha dado 26 obamas para entrar naquele lugar - então eu entreguei o ticket já destacado para o rapaz da entrada e falei:
- Não sei se você lembra, mas eu estive aqui alguns minutos atras e você já destacoou meu ticket. Mas eu tive que sair da fila para tirar uma foto com o Dr. Tyson. Posso entrar mesmo assim?  
Ele me olhou com uma cara de descrença e falou: 
- Se você me mostrar a foto, eu acredito em você. 
Peguei a máquina tremendo demais, quase não conseguia segura-la. Quando o rapaz pegou a máquina, ele perguntou: "Você tá tremendo toda porque viu ele?" e  eu entre lágrimas : "Sim... ".  Ele balançou a cabeça e disse: "Então entra moça, entra logo! OMG, ela tá tremendo toda." 
Resolvi parar de chorar. Entrei no planetário. Sente e olhei para a abóbada e esperei a apresentação começar. Quando eu finalmente parei de chorar, a apresentação começou. E qual foi a primeira imagem e assunto que apareceu? A antena de New Jersey. Uma belíssima narração do Dr Tyson falando da importância dessa antena. Aquela mesmo que eu contei em outra história aqui. Comecei a chorar novamente. Estava tudo interligado. Aquele dia era realmente o Dia do Tudo Pode e meu Dia do Tudo Posso.